30/11/2017

Grupo de Oração Madre Maria do Lado

Foi criado o Grupo de Oração Madre Maria do Lado, que reuniu pela primeira vez a 26 de Novembro de 2017 (Solenidade de Cristo Rei). O grupo tem como base a oração alicerçada na Palavra de Deus e na adoração eucarística, suplicando o bom andamento dos trabalhos da Causa de Beatificação da Madre Maria do Lado. Pretende ser um baluarte de oração para os membros do grupo, amigos e devotos da Madre Maria do Lado. Além de reuniões quinzenais, o grupo tem no dia 28 de cada mês a Santa Missa em acção de graças pelos benefícios recebidos e implorando a intercessão da Serva de Deus. As Irmãs Clarissas do Desagravo convidam os simpatizantes da Causa a inscreverem-se, crescendo no amor ao Santíssimo Sacramento e no conhecimento da vida da Madre Maria do Lado, disponibilizando os contactos do Convento: Convento do Louriçal, Rua da Misericórdia, n.º 10, 3105-165 LOURIÇAL; telef. 236 961 138; e-mail clarissas.lourical@sapo.pt; ou facebook.com/irmas.lourical.

26/11/2017

AO CALOR DA FOGUEIRA (26-11-2017)

– Louvado seja Deus! Pensei que já nem vinhas, Carlos!
– Boa tarde lhe dê Deus, Tio Ambrósio! Vejo que já se passou de armas e bagagens aqui para o calor da sua fogueira…
– Graças a Deus vieram os primeiros pingos de chuva e, depois das três, sopra aí uma aragem fria vinda do Norte. Daí que, apesar de me ter vacinado contra a gripe, o melhor é recolher-me cá para dentro, que o seguro morreu de velho. Mas tu vens aí como se ainda fosse Verão!
– A Joana já me aconselhou a trazer um agasalho. Mas desta vez ainda resisti, porque penso que este chuvisco vai ser de pouca dura. Infelizmente! Nós bem que precisávamos aí de duas ou três semanas de chuva, daquela miudinha, da que penetra lentamente na terra, que está sequiosa como quase não tenho lembrança.
– Nem eu me lembro duma seca assim, Carlos! Mas eu tenho confiança em Deus, e sei que Ele nos não vai deixar morrer à sede, embora todas estas alterações do clima sejam culpa dos homens, que não sabem respeitar a natureza.
– Possivelmente não poderemos culpar ninguém em especial, porque, nesta como em outras matérias, todos temos culpas no cartório…
– Uns mais que outros, Carlos! Se formos a analisar com alguma profundidade este problema, veremos que a raiz do mal começa na ganância de alguns que apenas pensam no dia de hoje, não tendo qualquer perspectiva de futuro. Há várias décadas que sábios avisados vêm chamando a atenção para os comportamentos que estão na origem destas nefastas alterações climáticas, mas os homens que estão à frente dos países mais industrializados e mais poderosos do mundo estão-se nas tintas para a resolução do problema. Vozes sensatas alertam para a necessidade de conservar as florestas, que são o pulmão do planeta que habitamos, pois sem elas não teremos o oxigénio necessário à vida, e o que vemos é a destruição das matas, quer através dos incêndios que tudo reduzem a cinzas, quer com o abate de árvores centenárias para comercializar as madeiras.
– O objectivo final é sempre o lucro, Tio Ambrósio!
– Eu digo que sim, Carlos! E quando se trata de obter lucros a qualquer preço, o homem passa por cima de todas as regras, pensando apenas no imediato, nem pensando que, com atitudes destas, estão a hipotecar o futuro dos filhos e dos netos…
– A natureza tem uma capacidade imensa de se regenerar, Tio Ambrósio! Mas penso que, neste capítulo, o homem já foi longe demais e que, nem que agora comece a arrepiar caminho, serão necessárias centenas de anos para que se volte ao equilíbrio inicial.
– Mas, olhando para a cena internacional, não vislumbro que os governantes dos povos estejam com intenção de resolver esta situação, que pode vir a desembocar na destruição total da nossa casa comum. Eu, devido à minha idade, já cá não estarei para ver as condições cada vez difíceis para a humanidade em geral, e para alguns povos em particular. Este problema da falta de água, que nós começamos a sentir nalgumas regiões do nosso país, arrasta consigo muitos outros que levam ao empobrecimento das famílias e dos cidadãos. Todos nós, que temos contacto com a terra e dela tiramos o fruto do nosso sustento, sabemos que sem água não há vida…
– E não há, Tio Ambrósio! De que nos vale termos as terras para semear se não tivermos água para regar as plantas? Eu sempre ouvi dizer que a água é o sangue da terra! Repare que, neste ano de seca grave, o seu castanheiro deu fruto saboroso. Mas o calibre da castanha foi muito mais pequeno do que em anos em que as chuvas vieram no seu devido tempo.
– Sem chuva e sem calor, nada se cria, Carlos!
– Água e calor na justa medida, Tio Ambrósio! Porque eu temo bem que, devido aos fogos que devastaram a nossa região, nos próximos anos a caloreira seja tal que não deixe germinar as sementes…
– Não vamos entrar num cenário tão catastrófico, Carlos! Mas não pensemos que tudo vai continuar a ser como dantes! A natureza tem as suas leis, e muitas vezes desculpa os nossos desvarios, mas lá vai chegar a altura em que reclamará para si os seus direitos.
– Seja como for, eu daqui a uns dias vou semear dois ou três regos de favas. Se vir que não nascem, repetirei a sementeira em Janeiro, porque, como diz o nosso povo, em Maio há sempre favas.
– Cá! Porque noutras latitudes ou não há favas, ou chegam mais cedo ou mais tarde! O teu cunhado Acácio, quando, na companhia da Ermelinda, fez a sua viagem aos países do Norte, tirou fotografias, que aqui me mostrou, a um canteiro de favas que ainda estavam em flor. E isto em pleno mês de Julho…
– Já não teriam tempo para dar grande fruto. Mas não há como experimentar! Assim como quem não quer a coisa, e para não passar por tolinho, vou semear, às escondidas, uma mão cheia delas em Abril ou Maio. Quem sabe se, em Setembro, no tempo das vindimas, não me poderei regalar com favas com entrecosto e um ovo escalfado?
– Seria bom que todos os pobres tivessem uma refeição dessas, pelo menos de vez em quando, Carlos! E, a propósito disso, no passado domingo, encontraste muitos casos de pobreza extrema cá na nossa freguesia?
– Da pobreza relacionada com a falta de alimento, não, graças a Deus! Mas o homem não tem fome e sede apenas de pão, Tio Ambrósio! Encontrámos alguns idosos a viverem sozinhos, num isolamento que não deve ser nada saudável. Demos conta destes casos ao nosso Presidente da Junta que, em ligação com o grupo paroquial de acção caritativa, vai envidar todos os esforços para que estas pessoas possam passar, pelo menos parte do dia, com outras pessoas no nosso pequeno centro social. E o Tio Ambrósio também podia passar por lá, de vez em quando, para conversar e até para merendar com aqueles jovens quase do seu tempo…
– São quase todos mais novos do que eu, Carlos! Mas os problemas e as agruras da vida deixaram em muitos marcas mais profundas que os próprios anos. De qualquer modo vou aceitar a tua sugestão, até porque também vai ser proveitoso para mim essa mudança de ares! Vai lá com Deus, Carlos!
– Até domingo, Tio Ambrósio!

19/11/2017

AO CALOR DA FOGUEIRA (19-11-2017)

– Um bom dia nos dê Deus, Tio Ambrósio!
– A todos nós, Carlos! Incluindo até os nossos inimigos! Estou a ver que voltaste a madrugar! Olha que hoje o nosso Padre Feliciano marcou a celebração da Santa Missa para o meio-dia! Não te terás enganado nas horas?
– Eu estou habituado a erguer-me sempre cedo! Quando é possível ainda sigo o conselho daquela cantilena que todos repetíamos na escola vezes sem conta: “Deitar cedo e cedo erguer, dá saúde e faz crescer”.
– Também me incluo entre os que fazem desse adágio popular um princípio orientador do seu comportamento, até porque sei que a preguiça continua a ser a mãe de todos os vícios. Mesmo ao domingo, mantenho o meu horário de sempre!
– Pois eu passei por aqui agora, porque de tarde tenho aí umas voltas a dar na companhia do meu cunhado Acácio.
– Não me digas que destinastes este dia para fazer a visita a alguns doentes e pobres da nossa freguesia. É que ouvi dizer que o nosso querido Papa Francisco instituiu, para todos os cristãos, o penúltimo domingo do ano litúrgico como o “Dia Mundial dos Pobres”.
– Vossemecê está sempre em cima dos acontecimentos, Tio Ambrósio! Quem nos alertou para esta celebração foi o Liberato, já lá vão umas três semanas, no final do nosso encontro de catequese de adultos. E logo ali resolvemos fazer uma reflexão sobre este assunto, que será precedida de uma prática de estilo evangélico. Tal como os discípulos foram, dois a dois, a todos os lugares onde Jesus havia de ir, também nós nos decidimos a fazer a experiência de ir ao encontro de alguém que sintamos que vive em situação de pobreza efectiva, tentando concretizar o tema que o Papa lançou aos cristãos como um desafio para esta jornada: “Não amemos com palavras, mas com obras”.
– Aí está uma concretização daquele desejo do Santo Padre de ver a Igreja e os cristãos a levarem a mensagem de Cristo às periferias, ou seja, aos marginalizados da sociedade, aos mais esquecidos, aos que são verdadeiramente pobres, entendendo esta pobreza nos vários sentidos que ela pode ter. Porque há vários tipos de pobreza, Carlos!
– Nós sabemos, Tio Ambrósio! Mas também reconhecemos que, para além da esmola que se dá a quem estende a mão, há muitas outras formas de ir ao encontro dos que vivem nas tais periferias de que costuma falar o Papa Francisco. O Liberato recordou-nos que este deve ser um dia de verdadeiro encontro com os pobres, que se transforme numa partilha que, aos poucos, se vá tornando num estilo de vida. O Papa não se tem cansado de nos indicar o caminho, dando ele próprio o exemplo, e afirmando continuamente que Jesus se identifica com os mais pequenos e os mais pobres. “Tudo o que fizerdes a um destes mais pequeninos, é a Mim que o fazeis”– diz o Evangelho.
– Ide, Carlos! Mas não façais grande alarde dessa vossa acção! No contacto com os outros, especialmente com os que verdadeiramente precisam da nossa ajuda, temos que ser muito discretos. É ainda Jesus quem diz que, ao ajudares alguém que precisa, “não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita”. A melhor ajuda que podemos prestar aos outros é sempre silenciosa. Doutro modo, perde todo o seu valor!
– Nós estamos a aprender, Tio Ambrósio! Mas também sabemos que a celebração do
“I Dia Mundial dos Pobres” deve ter alguma visibilidade…
– Toda a gente deve saber que ele existe, que o Papa o instituiu, e para tanto tem que ser anunciado e divulgado entre os cristãos e a sociedade em geral. Mas, depois, a acção concreta dos grupos que vão para as tais periferias, deve ser o mais recatada possível, sob pena de não atingir as finalidades a que se propõe.
– Vamos fazer a experiência, Tio Ambrósio! Há por aí muita gente, mesmo alguns bons e piedosos cristãos que afirmam já não haver pobres na nossa terra. Vamos ver se isso é verdade! Vamos à cata deles, na certeza que havemos de encontrar muitos mais do que imaginávamos à partida.
– É verdade que há muitos lugares da terra onde os que sofrem de pobreza material são em muito maior número do que aqui nas nossas aldeias, onde, além do mais, já está bastante enraizado o bom costume da partilha com os que menos têm. Mas não podemos reduzir a pobreza ao seu aspecto material. Por vezes até podemos falar de pobreza moral, Carlos!
– Se podemos! Uma família onde os respectivos membros passam a vida numa zanga contínua, com insultos e até com episódios de violência doméstica, já ultrapassou há muito os limites da pobreza.
– Cá no Cabeço não conheço casos desses…
– Graças a Deus, a nossa população é toda ela cordata, com uma vida fundamentada nos bons princípios que, felizmente, ainda vão passando de pais para filhos. Mas o Papa manda-nos ir às periferias, sair da nossa rua, ir se for necessário às povoações vizinhas ou aos bairros problemáticos dos arredores das cidades maiores…
– Não vos ides atrever a tanto, Carlos! Para iniciarmos a experiência de celebração do primeiro Dia Mundial do Pobres, creio que nos basta a observação dos problemas, grandes ou mais pequenos, que estão patentes aqui na nossa freguesia. Penso que não temos casos de pessoas que passem propriamente fome. Mas começamos a ter, por exemplo, muitas pessoas de idade que não têm quem as acompanhe a uma consulta médica, quem lhes avie os medicamentos na farmácia, ou mesmo quem lhes vá comprar a mercearia à venda do Sanguessuga…
– Nesse último ponto, o Manuel das Chagas tem tudo controlado. Basta que lhe façam um telefonema, que ele se encarrega de fazer chegar as compras a toda a freguesia…
– Já é um bom serviço que se presta aos mais idosos que, só por isso mesmo, podem ser contados entre o número dos pobres.
– Eu até estou em crer que, nesta nossa primeira saída, iremos encontrar alguns casos de abandono, de gente que não tenha quem cuide da sua pessoa e das suas coisas.
– Esses são pobres, Carlos!
– Pobres ou carenciados, Tio Ambrósio?
– E qual é a diferença, Carlos? Tu sabes bem que a pobreza não diz respeito apenas à falta de bens materiais. Eu digo-te mais! Estou em crer que há muitos que precisam sobretudo de quem os ajude a recuperar os bens espirituais. Vai lá com Deus para essa vossa nobre missão!

12/11/2017

AO CALOR DA FOGUEIRA (12-11-2017)

– Um santo dia para si, Tio Ambrósio!
– Vem com Deus, Carlos! Mas tu deves ter-te enganado nas horas! O magusto está marcado para as três da tarde!
– Tem toda a razão, Tio Ambrósio! Mas eu preferi vir de manhã, para preparar umas coisas! O Sanguessuga também era para vir comigo, mas disse-me que teve insónias, que dormiu mal e, por isso, só vai aparecer mesmo da parte da tarde.
– E tu a que horas vais almoçar?
– Fomos à missa logo de manhã e, enquanto eu passo por aqui, a Joana foi adiantar as coisas, de tal modo que até vossemecê pode ir comer a nossa casa…
– Tu sabes bem que isso me daria muito prazer! Mas também entendes que hoje não é bem o dia mais apropriado para eu sai daqui, estando à espera de todo o pessoal do Cabeço e arredores para a castanhada do São Martinho!
– Não se preocupe, Tio Ambrósio! Foi mesmo por isso que eu resolvi passar por aqui da parte da manhã, para lhe dizer que tudo vai correr às mil maravilhas, mesmo com algumas pequenas alterações que resolvemos introduzir neste nosso encontro anual. Nós sabemos que não é neste dia que o Tio Ambrósio completa mais um aniversário, o que virá a acontecer lá para os fins da Primavera…
– Andaste a ver o meu cartão de cidadão, ou então foste ao nosso Padre Feliciano para ele verificar lá nos livros de registo da paróquia em que dia, mês e ano a minha mãezinha me deu à luz. Mas quero dizer-te que a realidade é muito diferente da que os registos apresentam. Tu talvez não saibas, mas eu esclareço-te que, naquela época, havia uma lei que obrigava os progenitores a registarem os seus rebentos no prazo de uma semana. Se assim não acontecesse, a multa era pesada e, como deves calcular, o dinheiro era pouco. Passou-se isto com dezenas e dezenas de famílias. A forma mais fácil de contornar a lei era atrasar o registo de nascimento dos filhos por algumas semanas, ou mesmo por alguns meses…
– Não me diga que o Tio Ambrósio não sabe a sua verdadeira data de nascimento e, por isso, desconhece a sua idade exacta…
– Eu conheço muito bem todos esses pormenores! Mas, tanto no meu caso, como em muitos dos rapazes e raparigas do meu tempo, celebramos o aniversário num dia muito diferente daquele em que vimos pela primeira vez a luz do dia. Por isso posso dizer que a minha data de nascimento é secreta. Embora a ti, que és como se fosses meu filho, eu um dia venha pôr-te ao corrente de todas essas coisas. Mas, por agora, convém que eu não tenha a idade que todos vocês julgam que eu tenho, embora seja do conhecimento geral e dos habitantes do Cabeço em particular que eu sou quase do tempo do Penedo da Torre.
– Estamos todos de acordo consigo, Tio Ambrósio! Mas em conselho geral dos veteranos do Cabeço foi resolvido que fizéssemos de conta que o seu aniversário acontece neste dia em que todos nos juntamos aqui à sua volta para saborearmos as suas famosas castanhas e que, para dar início a esta comemoração festiva, fizéssemos algumas alterações ao cardápio do nosso encontro. Castanhas com fartura, vamos ter!
– Cinco arrobas chegam para todos?
– Chegam, Tio Ambrósio! Mas vossemecê nunca ouviu dizer que as castanhas assadas, além de jeropiga e da água-pé, casam muito bem com umas febras de porco na brasa?
– Agora esses mestres de culinária, que proliferam por aí como tortulhos, arranjam umas combinações todas esquisitas, de tal forma que a gente nem sabe muito bem o que está a deglutir…
– Não é o caso! Muito pelo contrário! A minha cunhada Ermelinda, acompanhada de uma equipa de outras senhoras do Cabeço, andou a fazer uma recolha de receitas antigas. Até foram subsidiadas para isso pelo nosso Presidente da Junta, o amigo Liberato, com a desculpa para dar este arrombo no orçamento, dizendo que isto é cultura…
– E é, Carlos! Sabermos como se alimentavam os nossos antepassados, e como aproveitavam os frutos da terra para o sustento das famílias, é uma questão verdadeiramente cultural. Eu já te disse muitas vezes que a castanha estava na base da alimentação de muitos dos nossos antepassados. Pelo menos aqui, na minha família, costumávamos comer sopa de castanhas durante quase todo o Inverno. A minha mãe que Deus tem costumava também fazer um saboroso doce de castanhas, que era um dos que mais apreciávamos por aturas do ano novo. Mas essa de comer castanhas assadas com febras de porco grelhadas na brasa para mim é novidade! Mas aceito que seja um acepipe de a gente comer e chorar por mais! Eu sempre ouvi dizer que um homem anda a aprender até morrer.
– Pois o meu cunhado Acácio deve estar aí a aparecer, a chefiar uma equipa de voluntários, para montarem o grelhador, enquanto algumas senhoras ficaram a temperar as febras da perna do suíno que foi abatido de propósito ontem à tarde. Tudo fresquinho, Tio Ambrósio! Nós, quando pensamos numa coisa, não brincamos em serviço!
– Espero que não venhais a ter problemas com as autoridades sanitárias, que agora não costumam deixar que esses costumes antigos se cumpram, dizendo que em primeiro lugar está a saúde dos cidadãos…
– Garanto-lhe que não vai haver problema nenhum! Hoje, além de castanhas fornecidas pelo Tio Ambrósio, e da boa pinga fabricada na adega particular do nosso amigo Agostinho, vamos ter febras de porco, assadas na brasa à moda antiga. Vai ver que toda a gente vai dar por bem empregue o tempo que gastou e que a procura de castanhas para confeccionar pratos típicos vai subir no Cabeço e em outros lugares aqui das redondezas.
– Cá fico à espera para ver, Carlos! O que te posso garantir é que as castanhas não vão faltar. Este ano são mais pequenas que o habitual, mas, em vez de uma comem-se duas ou três.
– Olhe! Nem de propósito! Está mesmo a chegar a equipa do Acácio que vai instalar o grelhador! Eu, entretanto, dou um salto a casa, porque disse à Joana que não demoraria muito tempo. Até logo, se Deus quiser!
– Vai e volta, Carlos!

Catequese da Lousã celebrou o Holywins

É provável que esta tenha sido a primeira iniciativa do género na nossa Diocese (Holywins, em vez de halloween), por isso vale a pena conhecer, até porque, ao que parece, foi bastante divertido! Eis um relato na primeira pessoa:

No dia 1 de Novembro, a Igreja Católica (entre outras) celebra o Dia de Todos os Santos, em honra de todos os santos e mártires, conhecidos ou menos conhecidos.
Nesse sentido, e como não podia deixar de ser, a Catequese Paroquial da Lousã decidiu assinalar este dia com uma actividade para todas as crianças e jovens, assim como as suas famílias.
Esta actividade denominada “Holywins” (do inglês: “a Santidade vence”) pretendeu sensibilizar toda a comunidade de catequese para o dom da Santidade. Durante este momento de comunhão fraterna dos catequistas com as crianças e suas famílias, foram apresentados vários santos, como modelo de vida, tendo sempre presente a ideia que todos podemos aspirar à Santidade, como comunhão plena com Deus e Seu Filho Jesus Cristo.
A actividade decorreu no Centro Pastoral da Lousã, na véspera dia 31 de Outubro, a partir das 21h, altura em que os presentes puderam participar em vários jogos de tabuleiro sobre a história de alguns Santos e da libertação do Povo de Deus do Egipto. Alguns menos tímidos aproveitaram o microfone para apresentar os santos que estavam a representar, alguns com direito à vestimenta a condizer.
No final, este momento de alegria e boa disposição culminou com um pequeno “lanche” partilhado.
Sem dúvida nenhuma, uma actividade a repetir e a melhorar, porque: “O importante é semear. Cedo ou tarde, os frutos irão surgir”.
Carlos Antunes

05/11/2017

AO CALOR DA FOGUEIRA (05-11-2017)

– Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!
– Para sempre seja louvado e sua Mãe Maria Santíssima! Vens hoje muito piedoso, Carlos! Há muito tempo que não recebia uma saudação matinal das que antigamente todos usávamos no nosso contacto diário.
– Bons costumes que se foram perdendo, Tio Ambrósio! Mas estamos sempre a tempo de os retomar! E eu penso que tudo vai com o hábito! No que à minha família diz respeito, eu sempre tenho ensinado os meus pequenos a dizerem: “bons dias nos dê Deus!”. Por vezes esquecem-se, e sei que, na escola, não é essa a linguagem oficial. Por isso, quando a mais pequena, que é a sua preferida, me veio dizer que ia deixar de se dirigir assim às colegas, eu disse-lhe que compreendia perfeitamente a sua posição. Mas fui-lhe adiantando que, em casa, me daria um gosto enorme se se habituasse a este modo de saudar os pais e os irmãos.
– Vai insistindo, Carlos! Dizem que o ser humano é um animal de hábitos, e que tanto pode aprender os bons como os maus…
– Tenho a impressão que os hábitos maus, nomeadamente no campo da linguagem, são muito mais fáceis de adquirir, Tio Ambrósio! O Sanguessuga, que está habituado, na sua loja de secos e molhados, a ouvir de tudo um pouco, embora, quando começa a ser demais, costume chamar à atenção os clientes que já beberam um copito que, se querem dizer asneiras, sabem muito bem onde é a porta de saída… O Sanguessuga, dizia eu, um dia destes foi a Coimbra e vinha de lá escandalizado com os rapazes e as raparigas que estudam na Universidade, e que vão ser os médicos, os advogados e os dirigentes políticos de amanhã.
– A rapaziada está habituada ao calão!
– O Sanguessuga garantiu-me que nunca, nem mesmo quando andou na tropa, tinha ouvido tantos palavrões juntos como os utilizados por um grupo misto de rapazes e raparigas que, pelo seu modo de trajar, devem frequentar a Universidade. Nem os carroceiros de antigamente falavam de modo tão grosseiro!
– Eu escandalizado não fiquei, Carlos! Mas senti-me triste quando um jornal transcreveu, um dia destes, uma escuta telefónica entre dois políticos que desgovernaram o país durante alguns anos.  A linguagem era da mais baixa que se possa imaginar. Tão degradante como aquilo só a conversa entre dois pedreiros que andaram aqui ao lado a fazer uma obra para o Alberto Constantino, e que, em cada três palavras utilizadas, duas pelo menos eram asneiras daquelas de fazer corar o Bocage.
– São os tempos em que vivemos, Tio Ambrósio! E eu, quando oiço, vou-me calando porque também não sou perfeito. Mas o Tio Ambrósio pode falar, porque nestes anos todos não ouvi da sua boca uma única expressão que uma criança não pudesse escutar.
– Também não sou perfeito, Carlos! Mas, se me vem a tentação, nomeadamente quando me enervo, depois procuro corrigir-me…
– Eu nunca vi o Tio Ambrósio enervado!
– Quem te escutar há-de pensar que basta lavarem-me os pés e colocarem-me no altar! Mas, infelizmente, não é assim! É verdade que já dei alguns passos importantes, como seja o de perdoar todas as injúrias que queiram lançar-me. No entanto, quando me ponho na presença de Deus, sinto-me como o profeta Isaías que, em circunstâncias semelhantes dizia: “Ai de mim, estou perdido, porque sou um homem de lábios impuros, que habita no meio de um povo de lábios impuros”.
– Nesse caso, que direi eu, Tio Ambrósio?
– Só quem não faz um bom exame de consciência é que não descobre que tem defeitos suficientes para não ter coragem de atirar pedras aos vizinhos. Mas quem descobre a sua indignidade e a sua pequenez, penso que está no bom caminho para se tornar melhor!
– A propósito, Tio Ambrósio! Veio-me agora à ideia de lhe perguntar se acha que os nossos políticos, eles e elas, são pessoas capazes de botarem a mão na consciência e perguntarem-se a si próprios se o seu procedimento é o mais correcto e o que melhor serve o povo que neles depositou a sua confiança.
– Tu fazes-me cada pergunta, Carlos! Sei lá! Eu vejo a cada passo ministros e deputados a afirmarem que nada lhes pesa na consciência. Quem sou eu para desdizer as suas afirmações?
– Não é preciso o Tio Ambrósio desdizer! Basta ouvirmos o que dizem e depois olharmos para os factos. Os factos é que desdizem as mentiras com que eles vão enganando o povo! O Sanguessuga até costuma afirmar que todo o político é um mentiroso encartado! E mais! Nós somos tão simplórios que ainda lhes pagamos para eles nos aldrabarem a torto e a direito…
– Não os podemos medir a todos pela mesma bitola, Carlos!
– Esse reparo fiz eu ao Sanguessuga!
– E ele?
– Sem pestanejar, corrigiu, dizendo que, com raríssimas e duvidosas excepções, todo o político é um mentiroso compulsivo!
– O Sanguessuga lá sabe as razões que o levam a fazer uma afirmação desse género! E como estamos em tempos de liberdade democrática, quem é que pode pôr em causa a veracidade de tal afirmação?
– O Manuel das Chagas até queria tornar a sua afirmação mais abrangente, misturando no mesmo saco a mentira e a corrupção.
– Mas tu não deixaste…
– Procurei botar água na fervura, chutando para canto, e remetendo o caso para o tribunal do Povo que, como todos sabemos, vai estar reunido aqui na próxima semana para a nossa habitual castanhada.
– É verdade, Carlos! No domingo que vem, quero aqui todos os habitantes do Cabeço e das povoações vizinhas para participarem no magusto que tenho todo o gosto em oferecer…
– O Tio Ambrósio oferece as castanhas! E chega! Porque nós estamos a tratar das entradas e das bebidas! Apesar de terem ardido algumas videiras, por este ano não vamos sentir a falta de uma pinga de estalo, da colheita do nosso comum amigo Agostinho, que prometeu abrir nesse dia uma das cubas, para todos podermos fazer a prova da pomada que promete estar excelente.
– A ver vamos, Carlos! E até pode acontecer que o convívio sirva para amenizarmos as nossas opiniões, nomeadamente sobre os pobres dos políticos…
– Pobres, Tio Ambrósio? Diga essa ao Sanguessuga!
– E digo, Carlos! Entretanto, tu vai lá com Deus!
– Obrigado pelos seus conselhos, Tio Ambrósio! Que Deus lhe pague!